“Amor? É uma loucura do sangue que o espírito consente”- W. S. “Vi-a, corei e empalideci, elevando-se um tumulto na minha alma enlouquecida. Os meus olhos deixaram de ver, não conseguia falar e todo o meu corpo parecia que ardia”- J.R.. Estas duas citações, levam-nos para aquilo que se designa por paixão, porque o amor, no sentido incondicional do termo e tão difícil de definir, poderá acontecer, ou não, depois de “saciada” essa emoção mais corporal do que afectiva. O amor, nessa fase de maturidade, digamos assim, contém, dentro de si, emoções que nos podem destruir, como seja o medo, a tristeza, a cólera, o desejo sexual, a insegurança afectiva e da intimidade, etc. Se não houver outros suportes nos desejos e sentimentos das partes envolvidas, passada a fase da paixão, poderá surgir a rotura, por vezes violenta ou, no mínimo frustrante porque reveladora de incompatibilidades perante uma vida em comum que se tornou mais difícil ou entrou em rotura e desregulação. O dia de S. Valentim é, em termos de negócios muito importante e a lenda (melhor, as duas lendas com origens e versões diferentes mas todas com o mesmo sentimento: celebrar o enamoramento e o amor) é ternurenta mas o marketing aproveitou-se dela e , assim, o dia dos namorados foi pervertido. Nesse dia, os “namorados” procuram celebrar o enamoramento e o amor (aqueles que o têm) ou fingem que ainda há amor para que o ambiente e as relações conjugais não se esfriem ou fiquem mais tensas. E de modo a evitar males maiores, pode “mentir-se ao amor”, ofertando algo que tente substituir o amor que é feito de entregas ao outro, de reconhecimento e de envolvimento mútuo, pois o amor profundo é feito de dádivas e amar o outro como desejaria ser amado. Como sintomas de que “namorar e amar dá muito trabalho”, precisamos de inventar festas e atitudes que preencham um certo carnaval da nossa vida, muito “materialista” e, mesmo que inconscientemente, esvaziarmo-nos, pelo que há muitos lares onde apenas restam os escombros, porque está vazio ou cheio de feridas, por vezes carregadas de ódio ao outro. Ali restam as memórias e as recordações do que foi um lar cheio de sonhos assente num objectivo comum : o amor.
Mas e aqueles que não têm um amor, aqui este amor no sentido conjugal e não nas outras formas de amor, essas mais genuínas e puras, como vivem? Há estudiosos desta matéria que concluíram que não existe amor entre adultos, mesmo que sejam “conjugais”. Entre esses, existe uma relação que se baseia, por vezes, dependendo da idade e duração das mesmas ou dos pares, noutros factores como sejam atracção física, sexual, interesses socioeconómicos, etc. Mas os interesses pelo amor, tema que factura milhões em várias áreas (cinema, literatura, música, espectáculos diversos, festas de celebração, etc.), aumentaram desde que o casamento no ocidente começou a ter como base o “amor” e não apenas um contrato, como ainda o é em muitos países, religiões, etc. Obviamente, com esse “amor” é muito provável que depois surja o “desamor”, seja no conceito da perda da paixão e da atracção ou convertida mesmo numa forma de intolerância e que pode levar à violência conjugal (com mau historial no nosso país, tal o número de factos e mortes de mulheres, que ocorrem em cada ano) cuja origem está nas roturas conjugais onde o amor ou nunca existiu ou a roturas fizeram emergir graves defeitos das mentes de muitas pessoas, algumas elas próprias vítimas de violência familiar anterior.
Segundo alguns estudiosos, o único, genuíno e verdadeiro amor é aquela sensação e as relações de e para com as crianças, principalmente para com os nossos filhos. Depois e porque estes crescem e se convertem em adultos, o amor já não tem a mesma riqueza e surgem até divergências, por vezes violentas. Ademais, embora cada vez mais raro, porque o “amor conjugal” se desviou para outros campos (consumismo, hedonismo, zoomania – mania em ter animais ou interesse e “amor “ excessivos pelos mesmos -, etc.) a natalidade desceu e, por isso, há cada vez menos netos, privando-nos, assim, de voltarmos a sentir o verdadeiro amor para com e das crianças. Porque o amor abre e fecha ciclos nas nossas vidas e pobres daqueles que não têm a felicidade de voltarem a saborear esse enorme prazer. Diria até que é indescritível o amor que podemos sentir por uma criança, desde que ela nasce até se converter num adulto, por vezes já numa adolescência sem a mesma pureza ou mesmo muito problemática e conflituosa para com os seus ascendentes (pais e avós).
O amor é uma utopia, contudo se para uns é “um faz de conta”, para outros, é algo sublime, mesmo até entre dois adultos, agora sem preconceitos sexuais, que pode ocorrer até já nas idades dos “entas”. E se ambos puderem partilhar esses amor com os netos, que até podem ser – “os meus, os teus e os nossos” – se a saúde ajudar, então o nosso “final de vida” pode ser maravilhoso e terno. Até lá e porque a vida é feita de gerações, embora com uma séria ameaça de rotura, celebremos o dia dos “namorados”, mas façamo-lo com muito mais do que a troca dum objecto de consumismo ou de marketing ou praticar um gesto hipócrita, tipo faz de conta. Será uma oportunidade para nos envergonharmos do número de mulheres mortas (quarenta e três no ano de 2014), e da violência doméstica, pelos seus companheiros, alguns ainda e apenas como namorados. Neste ano de 2015, o número de casos parece estar na linha da do último ano, revelando que as relações e as roturas conjugais são um problema grave e a merecer, por isso, a atenção de todos nós, porque há ainda as crianças afectadas por esses homicídios e orfandade, até porque, em muitas situações, acabam em suicídios dos autores.
Aceitemos que o amor, embora também noutras áreas, é a arma mais poderosa contra muitas doenças das sociedades modernas (ódio, racismo, solidão, depressão, egoísmo, materialismo, etc.), pelo que devemos adoptar as nossas atitudes , gestos e assertividade de modo a que se evitem os conflitos. Até a medicina reconhece que o viver enamorado das pessoas e da vida (namorar, amar, auto-estima, positivismo, etc.) é das melhores receitas para proteger o coração, aqui no sentido físico, porque libertamos grandes quantidades de hormonas que ajudam a proteger-nos, também contra a depressão, esta já considerada uma epidemia dos tempos modernos, etc. Aquilo que recebemos, através do amor verdadeiro, é muito mais do que quanto damos, seja a crianças, adolescentes, adultos e idosos, porque em todas estas faixas etárias existe muita falta de amor e solidão e que, em muitos casos, a dor mata. Contudo, o amor é como uma planta que, para não morrer antes do seu tempo, tem que ser cuidada de modo a resistir às tempestades da vida, mas também à bonança e gerar os frutos que alimentam a alma. Amar é cuidar e saberemos como fazer isso? Para a vida profissional e até para o lazer, tiramos cursos e investimos dinheiro e tempo, mas para a nossa vida afectiva, familiar e social, somos auto-didactas. Não é suficiente, dizem os “psis”, pelo que as sociedades modernas pagarão um custo elevado pelas consequências do desamor. Que S. Valentim nos acuda, apetece-nos gritar em prece e vale a pena meditar: «Este amor tão violento, tão frágil, tão terno, tão desesperado. Este amor, belo como o dia e mau como o tempo, quando está mau tempo. Este amor tão verdadeiro, tão feliz, tão alegre, mas tremendo de medo como uma criança no escuro «- do livro Saber Amar.