Médicos venezuelanos desistem de processo de reconhecimento em Portugal

Os profissionais da saúde pedem “livre circulação” com Espanha para obterem reconhecimentos

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Os médicos luso-venezuelanos formados no estrangeiro desesperam pelo reconhecimento de habilitações e agora pedem livre circulação com Espanha para entregar presencialmente um conjunto de documentos requeridos para dar continuidade ao exercício da sua profissão em Espanha, “para a qual estamos devidamente habilitados e capacitados”.

“Tudo isto porque para nós o processo em Portugal é demorado, discriminatório, dispendioso, subjetivo na sua análise e não garantido”, pode ler-se na carta redigida por Christian de Abreu, representante dos profissionais médicos portugueses formados na Venezuela.

Neste sentido, procuram outras soluções para que o processo de reconhecimento seja mais célere, pedindo, em carta enviada ao Ministério da Administração Interna, que lhes seja permitida uma “livre circulação na fronteira com Espanha”.

No passado dia 29 de janeiro, o gabinete do ministro da Administração Interna anunciou a limitação nas passagens nas fronteiras com Espanha, “o qual vem instituir a reposição, a título excecional e temporário, do controlo de pessoas nas fronteiras terrestres e fluviais”.

A medida vem condicionar estes profissionais que, segundo Christian de Abreu estão “fartos de espera, lobbies e burocracia inexplicáveis para resolução do governo [português] à nossa situação”.

O representante lamenta, por fim, que ele e os seus colegas se vejam ‘obrigados’ a cruzar a fronteira “porque o país [Portugal] que representa as nossas origens tem uma «entidade» que regula a profissão «demasiado fechada» e que com segundas intenções limita mais de 800 profissionais que neste momento estão neste país”.

Governo prevê a contratação de médicos estrangeiros

O Governo aprovou um decreto-lei que irá permitir a contratação de 160 médicos estrangeiros, realçou Mariana Vieira da Silva, ministra de Estado e da Presidência após reunião do Conselho de Ministros. O diploma que regulamenta a alocação desses recursos prevê «a contratação a termo resolutivo, até ao limite de um ano, de titulares de graus académicos conferidos por instituição de ensino superior estrangeira na área da medicina e na área da enfermagem, desde que preenchidos determinados requisitos», refere o comunicado do Conselho de Ministros.

Relativamente a médicos estrangeiros, Mariana Vieira Silva definiu que um dos requisitos passa por ter feito a prova escrita de acesso normal à prática de medicina em Portugal e desta forma, a ministra avançou que esta contratação pode abranger um universo de 160 médicos licenciados no estrangeiro e que estão nestas condições.

“O que é aprovado neste decreto é a possibilidade de contratação de profissionais de saúde formados no estrangeiro mediante um conjunto de condições. Os candidatos que agora assumimos que podem prestar serviços médicos são aqueles que tenham realizado a prova de comunicação e a prova escrita, dispensando portanto a prova oral. Este é o momento de procurar respostas céleres”, realçou a governante.

No caso dos médicos que tenham um curso feito fora da União Europeia, o processo, antes de poderem pedir a inscrição na Ordem dos Médicos (OM), tem quatro etapas. A primeira é uma prova de língua portuguesa (de que são dispensados todos os que tenham o Português como primeira língua); a segunda uma prova escrita de conhecimento, a que se segue, caso sejam aprovados, provas práticas (trabalho directo com os doentes) e, por fim, uma defesa de tese. O que está vertido no decreto é a possibilidade de contratar aqueles que tenham passado na prova escrita de conhecimentos médicos.

Em conferência de imprensa, a ministra justificou a excecionalidade destas medidas com a necessidade de «alargar o mais possível as contratações de profissionais» de saúde perante uma «situação extremamente grave e de muita sobrecarga do SNS».

Questionada sobre a contratação de médicos e enfermeiros portugueses reformados, Mariana Vireira da Silva ressalvou que tal depende da «disponibilidade dos próprios», pelo que era difícil estimar o número, cita a Lusa.

«Os mecanismos de gestão previstos só podem ser usados para fazer face ao aumento excecional e temporário das funções diretamente relacionadas com a pandemia da covid-19, incluindo o respetivo plano de vacinação, e enquanto se mantiver essa necessidade».

Ordens rejeitam inscrever médicos estrangeiros não reconhecidos

A mobilização de médicos com formação no estrangeiro para o combate à pandemia, prevista no novo decreto presidencial, está a gerar polémica. O Conselho Nacional de Escolas Médicas diz que existem 160 médicos estrangeiros em processo de validação de competências, clínicos estes que podem assim receber uma autorização temporária, mas por outro lado, a Ordem dos Médicos recusa inscrever qualquer médico que não esteja devidamente reconhecido.

“É uma autorização que nós propusemos de um ano, para que esses médicos possam executar tarefas não diferenciadas, mas como médicos. Uma das propostas é que tivessem, pelo menos, dois anos de experiência, para ultrapassar algumas dessas dificuldades e dar apoio aos médicos que estão a desenvolver este grande esforço em território nacional”, explicou Henrique Cyrne Carvalho, Presidente do Conselho Nacional Escolas Médicas.

O Bastonário da Ordem dos Médicos diz-se surpreendido com o decreto e com a proposta. “Não há soluções alternativas, ou têm o reconhecimento de medicina ou não têm, não me parece que uma solução alternativa vá resolver o problema. Se há dúvidas, se os tais colegas são ou não médicos, se têm ou não formação adequada em termos daquilo que é o curso de medicina, eu julgo que temos que ter mais prudência. No fundo a ordem tem que seguir aquilo que é a lei definida pela Assembleia da República nesta matéria”, garantiu Miguel Guimarães, Bastonário da Ordem dos Médicos, em declarações ao mesmo canal.

A Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, diz que o Governo “nunca devia ter avançado com o decreto sem ouvir as ordens das duas classes profissionais afectadas”. Isto porque, argumenta, “há questões de ordem jurídica e de segurança” a ter em linha de conta.

Sobre a primeira, ainda está a ser analisada, mas a porta-voz dos enfermeiros diz ter “muitas dúvidas” se o decreto não viola uma série de normas. “Estão a dizer que estas pessoas não precisam de passar pela Ordem. Isto levanta várias questões, nomeadamente de responsabilidade disciplinar. A Ordem dá aos seus membros um seguro de responsabilidade civil. Se eu provoco um dano, o seguro cobre. Nestes casos, quem o vai assegurar?”, questiona.

Mas os problemas, para a bastonária, não se ficam por aqui. Ana Rita Cavaco diz que a OE “detecta coisas muito graves, incluindo diplomas falsos”, no momento de decidir a inscrição de enfermeiros com cursos tirados fora da União Europeia — mesmo depois de terem passado pelo escrutínio das escolas superiores de enfermagem. “O Governo não tem estratégia para fixar os nossos enfermeiros, a quem oferece contratos de quatro meses, e está a oferecer um contrato de um ano a pessoas que nem sei se são enfermeiros”, atira.

No caso dos enfermeiros, o decreto publicado define que podem ser contratados aqueles que sejam “titulares de graus académicos conferidos por instituição de ensino superior estrangeira na área da enfermagem, de nível idêntico aos dos graus de licenciado conferidos pelas instituições de ensino superior portuguesas”, desde que cumpram também uma de duas condições: “Ter concluído um ciclo de estudos com, pelo menos, 3600 horas de ensino, das quais 1800 horas em ensino clínico” ou “deter mais que cinco anos de experiência profissional na área clínica”.

A bastonária da OE argumenta que a falta de enfermeiros poderia ser resolvida recorrendo a outras soluções. “Qual era a dificuldade de fazer um apelo, até envolvendo a OE, dizendo aos mais de 20 mil colegas que estão no estrangeiro — e que querem regressar —, venham, que terão um contrato por tempo indeterminado? Andamos a pedir isto desde Março. Além disso, temos cerca de 200 enfermeiros parados, porque saíram de um contrato de substituição e a lei diz que, nestes casos, são obrigados a esperar três meses antes de assinar outro contrato. São pessoas que estão em casa e que querem trabalhar.”

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